TU ES SACERDOS
IN AETERNUM
1.
O grande passo para o sacerdócio.
2.
Alter Chistus.
3.
O sacrifício.
4.
O sacrifício da Nova Aliança.
5.
O Santo Sacrifício da Missa.
6.
A eucaristia-sacramento.
1.
O grande passo para o sacerdócio.
O grande
passo. Muitos e importante passos tem dado o sacerdote: passos para Deus.
O primeiro
transportou-o para além do abismo, que separa o homem não batizado de Deus: foi
transformado em templo do Espírito Santo; tornou-se criatura grata a Deus,
porque a ele consagrada e por ele santificada: sobre ele pousaram os olhos
divinos com agrado e complacência...
* * *
E os dias e os
anos se sucediam rápidos. Deus olhava-o com agrado. Dois corações se amavam:
Jesus e ele se uniram. Jesus deu-se todo a ele na sagrada comunhão. Foi o
segundo importante passo para Deus.
Não já pelos
padrinhos; mas por si mesmo renunciou no dia da primeira comunhão ao demônio,
às suas honras, pompas e glórias. Rejubilaram os céus...
* * *
E os dias e os
anos se sucediam ainda mais rápidos. Deus usava de deferências amorosas para com
ele. Abria-lhe com carinho a estrada dos seus passos. Mandava seu anjo para
apartar do caminho as pedras que o podiam fazer tropeçar e lhe magoar os pés.
Mandava sua
Mãe para lhe estender a mão nos dias de trevas: houve um tempo de trevas no
caminho do Senhor e de luzes no caminho de lúcifer. Foi o tempo em que se lhe
abriram os olhos; e a Estrela do mar foi o seu farol norteador. Em dias de
fraqueza, mandava seu filho para alimentá-lo do Pão dos fortes. Deus pôs seus
olhos amorosos nele...
* * *
Saiu forte da
luta. Por que se não abalançaria a um novo importante passo para Deus? Fê-lo.
União mais íntima não perfazem os laços do amor, do que a que criou uma alma
com deus, pela emissão dos santos votos.
Desta vez não
só renunciou ao demônio e suas obras, como fez no batismo e na primeira santa
comunhão; renunciou, outrossim, ao mundo e à carne, com o deslumbrante cortejo
de bens e gozos legítimos que o mundo pode oferecer.
Deus o amou, e
ele amou a Deus.
Jesus amou-o,
e ele amou a Jesus.
A Virgem
amou-o, e ele amou a Virgem.
A Corte
celeste amou-o, e ele amou a Corte celeste...
Três grandes e
importantes passos esses que deu! Três grandes venturas, na verdade!
Mas o quarto,
“O Grande Passo”, vence em importância e em ventura os três.
Com o primeiro
travou relações de amizade com Deus; com o segundo estreitou as relações de
amizade a ponto de familiarizar-se com Deus; com o terceiro, enfim, passou da
familiaridade à consociabilidade. Celebrou núpcias divinas. Esposou o Esposo
divino. E seria possível um quarto passo para Deus nesse mundo?
Poder-se-ia
idear um consorcio mais íntimo com Deus do que o de esposos?
Deus o pode! E
Deus ideou-o. O consórcio que une sacerdote a Deus é tal qual jamais criatura
alguma houvera sonhado.
E ele
deu o passo, o quarto grande passo; o passo que o elevou tão perto de Deus, que
por pouco, não se tornou um outro Deus.
É
Sacerdote do Altíssimo, Ministro de deus, Levita do Senhor, um “Alter Christus”
– um outro Cristo – o Ungido do Senhor.
Eis o
grande passo!
* * *
Ele o confidente
íntimo de Deus! Ele chamado por Deus não servo, mas amigo! “Já não vos digo
servos, mas amigos” (Jo 15, 15).
Todo o
poder lhe foi dado no céu e na terra. O que ele ligar na terra será ligado no
céu; o que ele desligar na terra será desligado no céu.
Jesus
seu amigo! Ele é um outro Cristo; Cristo é um outro ele.
Identificam-se
os seus ideais, as aspirações e os seus poderes sobre Deus pai e sobre os
homens, seus irmãos. Manda a Deus que desça sobre o altar do sacrifício; e
Deus, obedecendo desce.
* * *
Oh! O grande passo! Ó passo
venturoso!
Já está dado. O caráter
sacerdotal está indelevelmente impresso em sua alma!
“Tu es sacerdos in aeternum”.
Passo, em verdade, grande e de
grandes responsabilidades!
Mas “alea jacta est” – o dado
está lançado. – Já não há de recuar. E por que haveria de recuar? Amedrontam-no
acaso as responsabilidades? Assoberbam-no as dificuldades? É-lhe nimiamente
pesada a cruz?
Mas não se tem assentado à
direita de Jesus, só quando se persuadiu que poderia e saberia beber do cálice
por que bebeu Jesus?
E não se persuadiu disso só
confiado naquele que sabe e pode e quer confortá-lo? Tudo pode naquele que o
conforta!
2. Alter Christus.
Um outro Cristo! Um outro ungido
do Senhor! Um outro Eleito de Deus – Já não vos direi servos, mas amigos meus!
– Um outro Mediador, enfim, entre Deus e o homem! – É a escada de Jacob, por
que descem e sobem os anjos da Graça Divina!
Chama-se Sacerdote do Altíssimo!
– Tu sacerdos in aeternum! – É quem dispensa as coisas sagradas; quem se
apresenta como intermediário entre Deus e os homens: entre Deus, de quem recebe,
e os homens a quem distribui; entre Deus a quem oferece as dádivas, e os
homens, que o incubem da tarefa de as dispensar a eles.
Chama-se um outro Cristo; porque
é em terra um seu verdadeiro substituto. Substitui a Cristo como verdadeiro
Mediador.
Se São Paulo diz que há um único
e verdadeiro Mediador que é Cristo, o qual se entregou a si mesmo à morte para
resgatar o gênero humano e satisfazer ao Pai pelos homens, diz com isso que Cristo
é, outrossim, o único Sacerdote. E único Sacerdote Ele é na verdade! Mas,
doutro lado, ensina a fé que, como Ministro do Altar, é o padre verdadeiramente
mediador, verdadeiramente sacerdote. Como se entenderá isto? Do modo mais
simples. Considerado como pessoa privada, não é senão um homem como os mais;
mas, como Ministro de Deus, representa Jesus Cristo mesmo, de quem recebe todo
o poder, autoridade e eficácia de sua mediação.
Duplo poder lhe é conferido: um
que exerce sobre o Corpo e sangue de Jesus Cristo; outro que exerce sobre o seu
corpo místico, que é a Igreja ou a reunião dos fiéis. O primeiro torna-o um
sacrificador; o segundo, um padre, um doutor, um médico um juiz. Mas tudo isto,
todas estas funções exerce-as só em nome de Cristo.
Cristo, pois, é o único Mediador
entre deus e os homens, e se a fé diz que o Padre o é também, só o é porque
Cristo está nele. Eis por que é um – Alter Christus! – um outro Cristo no pleno
rigor da palavra!
*
* *
Agora, sim, nos damos conta da
solenidade das cerimônias litúrgicas com que o Pontífice do Senhor consagrou
Sacerdote ao neo-presbítero!
Escolheu ele a hora mais solene,
a do santo sacrifício da Missa. Antes de o ordenar, interrogou a todos
presentes, mais uma vez, depois de o haver feito já antes com extremo cuidado,
se eles o consideravam digno, tanto quanto o possa ser uma criatura, para
receber a ordem sacerdotal.
Não havendo quem se lhe opunha, o
Consagrante dirige-se ao Consagrado. Relembra-lhe, com força e unção, a
grandeza dos deveres, de que o sacerdote assume a responsabilidade. Invoca a
adorável Trindade, Maria, Mãe de Deus, os Apóstolos, os Mártires, os
confessores, as Virgens, toda a corte celeste, para que lhe venham em auxílio,
dizendo: “Senhor, dignai-vos abençoar, santificar e consagrar o vosso eleito!”
Avança o consagrado para o Altar.
O Bispo, em silêncio, põe-lhe sobre a cabeça as mãos. Fazem depois o mesmo os
sacerdotes presentes ao ato, um após o outro; e estendem sobre ele a mão
direita. Momento solene! Momento em que se imprime na alma do novel levita o
caráter indelével de sacerdote; é a graça sacramental, que o Bispo lhe obtém
pela recitação das palavras do sacramento da Ordem! É agora que o Espírito do
Senhor vem repousar sobre sua cabeça. Afigura-se-lhe, então, que se abrem os
céus, com outrora se abriram sobre as águas do Jordão, e que se houve a voz do
Pai a dar testemunho deste seu novo Cristo: “Este é meu filho amado, em quem
pus as minhas complacências”. E, de feito, Jesus é quem neste momento renasceu
nele! Apraz a cristo perpetuar sua estadia entre os homens, nascendo sempre de
novo em cada neo-sacerdote.
Sente-se o recém-ordenado
sacerdote do Altíssimo – Tu es sacerdos in aeternum. – Por tal o reconhece o
Consagrante; passa por isso a revesti-lo dos hábitos sacerdotais: cruza-lhe a
estola por sobre o peito, símbolo comovente da cruz que pesou nos ombros do
Sacerdote eterno, Jesus Cristo, no dia do seu sacrifício; põe-lhe a casula,
símbolo do amor; unge-lhe as palmas das mãos com o óleo dos catecúmenos, em
forma transversal, do polegar de uma mão ao índice de outra, dizendo: “Senhor,
dignais-Vos consagrar e santificar estas mãos com a unção e com a nossa benção,
para que tudo quanto elas abençoarem seja abençoado, e tudo quanto consagrarem
seja consagrado e santificado em nome de N.S.J.C.”.
Passa, em seguida, a entregar-lhe
os instrumentos. Faz-lhe tocar o cálice que contém água e vinho, e a patena com
a hóstia dizendo: “Recebe o poder de oferecer o sacrifício a Deus; e de
celebrar a Missa pelos vivos e defuntos, em nome do Senhor”.
E passa
imediatamente, acompanhando o Bispo, a celebrar a sua primeira santa Missa.
Depois da comunhão, impõe-lhe o consagrante novamente a mão na cabeça, dizendo:
“Recebe o Espírito Santo: a quem perdoardes os pecados, ser-lhe-ão perdoados; a
quem os retiveres, ser-lhe-ão retidos.” Poder inaudito! E sente objetar-lhe,
como outrora Jesus foi aparteado pelos escribas: “Mas quem pode perdoar os
peados, senão Deus?” (Mac 2, 7). De pleno acordo! É preciso ser Deus para poder
absolver um pecador; mas por isso mesmo é chamado na sagrada Escritura: “Vós
sois deuses”.
É o próprio
Deus que assim apelida aos Levitas da Antiga Lei, em vista do poder
extraordinário de que foram revestidos.
Na verdade, é
um Deus quanto ao poder de perdoar os pecados ou de os reter; porque está nele
o poder de Jesus, o poder de Deus. – É um outro Cristo. – É o depositário do
divino poder, mediador entre deus e os homens, imagem visível do Grande Pastor
de Ovelhas.
* * *
Oh! Não fora a
graça da fé, meu Deus, nunca acreditaria em tal! Não fora a graça do Vosso
amor, nunca homem algum se abalançara a tanto! O sacerdote um outro Cristo?! Um
Deus! Compreendo que vós, Jesus, mandeis ao homem que seja perfeito como vosso
Pai no céu é perfeito; mandais que aprenda de vós a humildade e vos imite em
tudo, porque sois o Deus feito homem e o neo-presbítero, um homem feito Deus: -
Alter Christus!
3. O Sacrifício.
É chegado o
momento soleníssimo, em que o neo-sacerdote sobe ao altar para oferecer o
sacrossanto sacrifício da cruz.
Que é um
sacrifício? O sacrifício verdadeiro e propriamente dito, segundo no-lo define o
próprio Espírito Santo pela boca de Moisés e São Paulo, é a oblação de coisa
sensível com a sua destruição quer parcial, quer total, quer seja física (como
se dá com o holocausto) quer mística, (como se dá com a libação e efusão de
vinho ou água) efetuada por um ministro legítimo e feita só a Deus, com o fim
de manifestar os sentimentos internos, com que o homem deve reconhecer o seu
supremo domínio. Desde que há memória do homem decaído, não faltaram
sacrifícios entre os povos.
Passando pelos
mais, limito-me a apontar o de Melquisedec, narrado nas Escrituras, e que tem,
por isso mesmo, o testemunho infalível do Espírito Santo, e que é muito próprio
para o nosso caso.
Melquisedec
ofereceu a Deus o sacrifício de pão e vinho, símbolo perfeitíssimo do
sacrifício da Nova Aliança, em que o pão, pelo poder das palavras da
consagração, se transubstancia em Corpo de Cristo, e o vinho em Sangue de
Cristo. Recordo ainda o sacrifício da lei mosaica, que é considerado debaixo de
quatro pontos de vista, devido aos quatro diversos fins: O sacrifício latrêutico, que visa direta e
exclusivamente, segundo a intenção do sacrificante, o fim de reconhecer por ele
o supremo e inalienável domínio de Deus sobre tudo o que existe. Por isso,
neste sacrifício há destruição total da oferta ou vítima, há destruição física;
e é por isso dito holocausto. – O sacrifício eucarístico, que visa diretamente o fim de render graças a Deus
pelos favores e benefícios outorgados; e chama-se “hóstia pacífica”. – O impetratório, que visa a obtenção de
novas graças e novos benefícios. – O propiciatório,
que visa aplacar a Deus, e por isso é chamado também de satisfatório, cujo
escopo é oferecer a Deus vítimas em expiação dos pecados, em satisfação das
penas devidas pelos pecados, e chama-se “hóstia pro delicto” e “hóstia pro
peccatis”.
Do dito se
colhe que o sacrifício tem como fim reconhecer a perfeição infinita do ser
Divino e do seu soberano domínio sobre quanto veio à existência por seu
infinito poder. O reconhecimento do Ser perfeitíssimo, que é Deus, é uma
Eucaristia ou agradecimento no pleno rigor da significação do termo; ela
abrange em sua verdadeira acepção as idéias da adoração, em virtude da qual o
homem se aniquila na presença da divina Majestade; da gratidão, que leva o
homem a exaltar os benefícios de Deus; da imperfeição, que induz o homem a
implorar as graças de que necessita; da expiação, que faz com que se obtenha a
supressão da justa ira do Senhor, prestes a fulminar sobre o homem o seu
tremendo castigo.
Estes são e
devem ser os quatro fins que visa todo e qualquer sacrifício que se oferece à
Divindade, os quais se podem reunir em um púnico, que é o de unir intimamente o
homem a Deus; e chama-se a eucaristia-sacrifício.
4. O
sacrifício da Nova Aliança.
Exposta a
noção geral do sacrifício, qual é entendido por todas as religiões verdadeiras
e falsas, releva acentuar mais a significação do sacrifício da Nova Lei, o
sacrifício da religião revelada, sacrifício da religião cristã, o único
aceitável a Deus, sendo o único prescrito por ele próprio. Abrogando Deus a
religião mosaica, aboliu o sacrifício que nela fora ordenado; e fundando uma
religião diversa da de Moisés, estabeleceu um sacrifício diferente do de
Moisés.
Cristo, o
Filho de Deus, veio ao mundo para fazer a vontade do Pai. Depois de haver
aperfeiçoado a lei de Moisés e modificando a religião judaica, instituiu um
sacrifício digno da lei e da religião divinamente acabadas: é o sacrifício de
um homem-Deus.
A natureza
humana, unida hipostaticamente à Pessoa divina, isto é, ao verbo, segunda
Pessoa da santíssima Trindade, não pratica ação que não se deva atribuir à
Pessoa; ora, em Jesus há uma única Pessoa, e esta é divina; Jesus é Deus, e o
que Deus faz é ato de valor infinito e, se bem que o sacrifício seja de
natureza humana, todavia o sacrifício de Jesus é ação que se deve atribuir à
Pessoa divina, ao Verbo; mas a ação do Verbo é infinita, logo, infinito é o
sacrifício; logo, o sacrifício do homem-Deus é de valor infinito. Portanto, de
todos os sacrifícios é o sacrifício de cristo, o Homem-Deus, que de um modo
mais perfeito preenche os quatro fins acima expostos; porque, considerada a
dignidade da vítima imolada em holocausto, que vítima houve jamais ou haverá
que supere em dignidade ou excelência a Vítima divina, Jesus Cristo? O
sacrifício de Cristo, embora um único, valeu infinitamente mais do que os
milhões e bilhões de vítimas puramente humanas ou irracionais de todos os
tempos.
Esta é a
verdade que a Igreja definiu nos Concílios Efesino e Tridentino, quando disse
que Cristo se ofereceu a Deus Pai sobre o altar da cruz, para lá efetuar a
nossa eterna redenção.
Sim, a morte
de Cristo na cruz foi um verdadeiro sacrifício. Em Cristo temos o sacerdote
constituído por Deus desde toda a eternidade e por isso legítimo. Em Cristo
temos a vítima sensível, verdadeira e realmente imolada na cruz. Temos
portanto, os dois requisitos essenciais para todo o sacrifício: o sacerdote e a
vítima. (N.B. Não é requisito essencial que seja o sacerdote quem mate a
vítima, mas sim quem a ofereça). Em Cristo temos outrossim perfeitamente
verificados os quatro fins do sacrifício: Cristo por sua morte na cruz
reconhece o supremo domínio de Deus, aplaca a divina majestade, expia as penas
dos pecados, impetra novas bênçãos do alto e rende graças a Deus pelos
benefícios recebidos.
5. O Santo
Sacrifício da Missa.
Enquanto
houver homens sobre a terra é mister que haja sacrifícios; e isto por força dos
fins que visa toda sacrifício: o reconhecimento da soberania absoluta de Deus,
o rendimento de graças ao Senhor pelos benefícios recebidos, a impetração de
novos favores divinos e o aplacamento da ira divina, ofendida pelos pecados, e
a satisfação das penas merecidas.
Ora, que outro
sacrifício poderia ser mais grato a Deus e preencher de modo mais perfeito a
finalidade do sacrifício do que o sacrifício do Homem-Deus?
Eis aqui por
que, fundando Cristo sua religião sobre a terra, lhe deu um novo sacrifício,
que é a continuação do sacrifício oferecido outrora, cruentamente, sobre o
Calvário: o sacrifício da Missa!
O sacrifício
da Missa é um verdadeiro sacrifício; porque é, primeiro, um ato público
efetuado segundo um rito determinado e por ministros para isso especificamente
deputados. Este rito e estes ministros foram instituídos por Deus mesmo, que
aboliu o rito e os mistérios da Lei Antiga. Por isto, de todos os sacrifícios,
é o da santa Missa o único aceitável a Deus, porquanto é ele a renovação e a
aplicação daquele do Calvário, do qual tem a plena eficácia.
É, em segundo
lugar, verdadeiro sacrifício, porque se oferece na Missa uma coisa sensível,
que é o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo, debaixo das espécies de pão e vinho,
o mesmo Corpo e o mesmo Sangue que um dia ficou imolado no alto do Calvário, oferecido
pelo próprio Sumo Sacerdote, Jesus Cristo. Se há uma diferença entre os dois,
esta consiste em que o Sacrifício do Calvário foi cruento; em que no Calvário
Cristo se ofereceu pessoalmente sem ministros, enquanto nos nossos altares se
oferece mediante o ministério dos sacerdotes; em que no Calvário o sacrifício
nos mereceu a redenção, e nos nossos altares, a aplicação dos frutos dela.
Portanto, não
há motivo algum para negar que o Sacrifício da Missa seja verdadeiro
sacrifício: temos nela o sacerdote e temos a vítima.
6.
A Eucaristia – Sacramento.
A respeito do
sacrifício seria incompleto se passássemos em silêncio um elemento, não digo
essencial, mais integral de todo o sacrifício: A Eucaristia-Sacramento.
Parece provado
que a todos os sacrifícios, assim pagãos como judaicos, estava anexa a ideia de
que, para ser completo o sacrifício, era mister unir-se à divindade com a
participação efetiva e real das vítimas: isto é, com a comunhão, como diríamos
hoje, em que se come da vítima.
Fosse como
fosse a ideia dos pagãos e judeus a respeito da comunhão, o certo é que o
sacrifício da Missa, não só é Eucaristia-Sacrifício, senão também
Eucaristia-sacramento. Sim, no sacrifício da Missa a criatura não só se dá
inteiramente a Deus em holocausto, mas é por Deus convidada a assentar-se à sua
mesa celeste, sobre a qual ele oferece a comer e a beber aquela mesma vítima, a
carne e o sangue preciosíssimos de Jesus.
Ó alimento
divinizado pela consagração! Alimento divino! O Corpo e o Sangue unidos à alma
e à divindade de nosso Senhor Jesus Cristo! Alimento único; pois só ele tem a
virtude de operar a fusão de Deus com o homem, união que proporciona à criatura
bens inúmeros, que a transforma e a torna sempre mais semelhante ao seu
Criador.
Que realidade
consoladora! Pela Eucaristia-Sacramento ou pela comunhão que devo fazer, sempre
que celebro, uno-me de modo admirável a Deus; nutro-me com a substância divina;
sou de certa maneira divinizado; preparo-me insensivelmente para a páscoa da
vida eterna.
* * *
Quer-me agora
parecer que não é necessário insistir ainda no valor do santo sacrifício da
Missa. É mais que evidente. Aqui temos um Deus que se imola, um Deus que é
imolado. Que cúmulo de mistérios!
Entretanto,
importa relembrar que o sacrifício da Missa é de valor infinito, para que
ninguém se escuse de não ter encontrado o suficiente para si. É um mar
inexaurível de graças e benefícios. Só quem bebe deste mar agrada a Deus; só
quem assiste à Missa presta a Deus o sacrifício por ele aceito. Afora o
sacrifício da Missa, nenhum outro pode ser agradável a Deus e proveitoso ao
homem e tão proveitoso, que santos do céu participam da sua glória, as almas do
purgatório e os vivos da terra gozam superabundantemente dos seus benefícios. É
que o sacrifício da Missa constitui o único holocausto verdadeiramente digno do
Senhor, em que se sacrifica o Cristo sempre vivo para interceder em nosso
favor. Aqui, como sobre a cruz, o Cristo se constitui o vínculo vivo que nos
une a deus.
No santo sacrifício
da Missa temos o ato em volta do qual gravita e dele se irradia o próprio
sacrifício da Redenção. Sim, na santa Missa, aquele mesmo sacrifício, oferecido
um dia sobre o Calvário, assume a condição como de coisa que ocupa a
circunferência, como de um satélite gravitando em volta do sol, como de uma
fonte viva que deságua no oceano. A santa Missa é o entro, é o sol e é o oceano
onde se concentra o próprio sacrifício do Calvário que é eterno, e ao mesmo
tempo perpetuado no tempo, no céu perante Deus e na terra entre os homens; é o
mistério da consumação de todos os desígnios de Deus, realizado um dia e
renovado por todos os séculos até ao fim do mundo.
* * *
É tendo
presente o exposto que o sacerdote deve oferecer o tremendo ato religioso.
Oxalá se aproximasse sempre para o futuro da ara sagrada do Senhor com estas
disposições de alma que o dominam ao presente!
Quem dera,
pudesse comunicar e, comunicadas, conservar estas mesmas santas e invejáveis
disposições nas almas de todos os assistentes ao santo e inefável sacrifício da
Missa! Quisera, sim, que todos os cristãos se persuadissem de vez por todas ser
o santo sacrifício da Missa o ato de religião mais necessário!
Publicado Anteriormente:
Introdução.
Introdução.