terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A Santa Missa na História e na Mística (TU ES SACERDOS IN AETERNUM)





TU ES SACERDOS IN AETERNUM

1.       O grande passo para o sacerdócio.
2.       Alter Chistus.
3.       O sacrifício.
4.       O sacrifício da Nova Aliança.
5.       O Santo Sacrifício da Missa.
6.       A eucaristia-sacramento.

1.       O grande passo para o sacerdócio.
O grande passo. Muitos e importante passos tem dado o sacerdote: passos para Deus.
O primeiro transportou-o para além do abismo, que separa o homem não batizado de Deus: foi transformado em templo do Espírito Santo; tornou-se criatura grata a Deus, porque a ele consagrada e por ele santificada: sobre ele pousaram os olhos divinos com agrado e complacência...

*  *  *

E os dias e os anos se sucediam rápidos. Deus olhava-o com agrado. Dois corações se amavam: Jesus e ele se uniram. Jesus deu-se todo a ele na sagrada comunhão. Foi o segundo importante passo para Deus.
Não já pelos padrinhos; mas por si mesmo renunciou no dia da primeira comunhão ao demônio, às suas honras, pompas e glórias. Rejubilaram os céus...

*  *  *

E os dias e os anos se sucediam ainda mais rápidos. Deus usava de deferências amorosas para com ele. Abria-lhe com carinho a estrada dos seus passos. Mandava seu anjo para apartar do caminho as pedras que o podiam fazer tropeçar e lhe magoar os pés.
Mandava sua Mãe para lhe estender a mão nos dias de trevas: houve um tempo de trevas no caminho do Senhor e de luzes no caminho de lúcifer. Foi o tempo em que se lhe abriram os olhos; e a Estrela do mar foi o seu farol norteador. Em dias de fraqueza, mandava seu filho para alimentá-lo do Pão dos fortes. Deus pôs seus olhos amorosos nele...

*  *  *

Saiu forte da luta. Por que se não abalançaria a um novo importante passo para Deus? Fê-lo. União mais íntima não perfazem os laços do amor, do que a que criou uma alma com deus, pela emissão dos santos votos.
Desta vez não só renunciou ao demônio e suas obras, como fez no batismo e na primeira santa comunhão; renunciou, outrossim, ao mundo e à carne, com o deslumbrante cortejo de bens e gozos legítimos que o mundo pode oferecer.
Deus o amou, e ele amou a Deus.
Jesus amou-o, e ele amou a Jesus.
A Virgem amou-o, e ele amou a Virgem.
A Corte celeste amou-o, e ele amou a Corte celeste...
Três grandes e importantes passos esses que deu! Três grandes venturas, na verdade!
Mas o quarto, “O Grande Passo”, vence em importância e em ventura os três.
Com o primeiro travou relações de amizade com Deus; com o segundo estreitou as relações de amizade a ponto de familiarizar-se com Deus; com o terceiro, enfim, passou da familiaridade à consociabilidade. Celebrou núpcias divinas. Esposou o Esposo divino. E seria possível um quarto passo para Deus nesse mundo?
Poder-se-ia idear um consorcio mais íntimo com Deus do que o de esposos?
Deus o pode! E Deus ideou-o. O consórcio que une sacerdote a Deus é tal qual jamais criatura alguma houvera sonhado.
                E ele deu o passo, o quarto grande passo; o passo que o elevou tão perto de Deus, que por pouco, não se tornou um outro Deus.
                É Sacerdote do Altíssimo, Ministro de deus, Levita do Senhor, um “Alter Christus” – um outro Cristo – o Ungido do Senhor.
                Eis o grande passo!

*  *  *

                Ele o confidente íntimo de Deus! Ele chamado por Deus não servo, mas amigo! “Já não vos digo servos, mas amigos” (Jo 15, 15).
                Todo o poder lhe foi dado no céu e na terra. O que ele ligar na terra será ligado no céu; o que ele desligar na terra será desligado no céu.
                Jesus seu amigo! Ele é um outro Cristo; Cristo é um outro ele.
                Identificam-se os seus ideais, as aspirações e os seus poderes sobre Deus pai e sobre os homens, seus irmãos. Manda a Deus que desça sobre o altar do sacrifício; e Deus, obedecendo desce.

*  *  *

Oh! O grande passo! Ó passo venturoso!
Já está dado. O caráter sacerdotal está indelevelmente impresso em sua alma!
“Tu es sacerdos in aeternum”.
Passo, em verdade, grande e de grandes responsabilidades!
Mas “alea jacta est” – o dado está lançado. – Já não há de recuar. E por que haveria de recuar? Amedrontam-no acaso as responsabilidades? Assoberbam-no as dificuldades? É-lhe nimiamente pesada a cruz?
Mas não se tem assentado à direita de Jesus, só quando se persuadiu que poderia e saberia beber do cálice por que bebeu Jesus?
E não se persuadiu disso só confiado naquele que sabe e pode e quer confortá-lo? Tudo pode naquele que o conforta!

2. Alter Christus.
Um outro Cristo! Um outro ungido do Senhor! Um outro Eleito de Deus – Já não vos direi servos, mas amigos meus! – Um outro Mediador, enfim, entre Deus e o homem! – É a escada de Jacob, por que descem e sobem os anjos da Graça Divina!
Chama-se Sacerdote do Altíssimo! – Tu sacerdos in aeternum! – É quem dispensa as coisas sagradas; quem se apresenta como intermediário entre Deus e os homens: entre Deus, de quem recebe, e os homens a quem distribui; entre Deus a quem oferece as dádivas, e os homens, que o incubem da tarefa de as dispensar a eles.
Chama-se um outro Cristo; porque é em terra um seu verdadeiro substituto. Substitui a Cristo como verdadeiro Mediador.
Se São Paulo diz que há um único e verdadeiro Mediador que é Cristo, o qual se entregou a si mesmo à morte para resgatar o gênero humano e satisfazer ao Pai pelos homens, diz com isso que Cristo é, outrossim, o único Sacerdote. E único Sacerdote Ele é na verdade! Mas, doutro lado, ensina a fé que, como Ministro do Altar, é o padre verdadeiramente mediador, verdadeiramente sacerdote. Como se entenderá isto? Do modo mais simples. Considerado como pessoa privada, não é senão um homem como os mais; mas, como Ministro de Deus, representa Jesus Cristo mesmo, de quem recebe todo o poder, autoridade e eficácia de sua mediação.
Duplo poder lhe é conferido: um que exerce sobre o Corpo e sangue de Jesus Cristo; outro que exerce sobre o seu corpo místico, que é a Igreja ou a reunião dos fiéis. O primeiro torna-o um sacrificador; o segundo, um padre, um doutor, um médico um juiz. Mas tudo isto, todas estas funções exerce-as só em nome de Cristo.
Cristo, pois, é o único Mediador entre deus e os homens, e se a fé diz que o Padre o é também, só o é porque Cristo está nele. Eis por que é um – Alter Christus! – um outro Cristo no pleno rigor da palavra!

*  *  *

Agora, sim, nos damos conta da solenidade das cerimônias litúrgicas com que o Pontífice do Senhor consagrou Sacerdote ao neo-presbítero!
Escolheu ele a hora mais solene, a do santo sacrifício da Missa. Antes de o ordenar, interrogou a todos presentes, mais uma vez, depois de o haver feito já antes com extremo cuidado, se eles o consideravam digno, tanto quanto o possa ser uma criatura, para receber a ordem sacerdotal.
Não havendo quem se lhe opunha, o Consagrante dirige-se ao Consagrado. Relembra-lhe, com força e unção, a grandeza dos deveres, de que o sacerdote assume a responsabilidade. Invoca a adorável Trindade, Maria, Mãe de Deus, os Apóstolos, os Mártires, os confessores, as Virgens, toda a corte celeste, para que lhe venham em auxílio, dizendo: “Senhor, dignai-vos abençoar, santificar e consagrar o vosso eleito!”
Avança o consagrado para o Altar. O Bispo, em silêncio, põe-lhe sobre a cabeça as mãos. Fazem depois o mesmo os sacerdotes presentes ao ato, um após o outro; e estendem sobre ele a mão direita. Momento solene! Momento em que se imprime na alma do novel levita o caráter indelével de sacerdote; é a graça sacramental, que o Bispo lhe obtém pela recitação das palavras do sacramento da Ordem! É agora que o Espírito do Senhor vem repousar sobre sua cabeça. Afigura-se-lhe, então, que se abrem os céus, com outrora se abriram sobre as águas do Jordão, e que se houve a voz do Pai a dar testemunho deste seu novo Cristo: “Este é meu filho amado, em quem pus as minhas complacências”. E, de feito, Jesus é quem neste momento renasceu nele! Apraz a cristo perpetuar sua estadia entre os homens, nascendo sempre de novo em cada neo-sacerdote.
Sente-se o recém-ordenado sacerdote do Altíssimo – Tu es sacerdos in aeternum. – Por tal o reconhece o Consagrante; passa por isso a revesti-lo dos hábitos sacerdotais: cruza-lhe a estola por sobre o peito, símbolo comovente da cruz que pesou nos ombros do Sacerdote eterno, Jesus Cristo, no dia do seu sacrifício; põe-lhe a casula, símbolo do amor; unge-lhe as palmas das mãos com o óleo dos catecúmenos, em forma transversal, do polegar de uma mão ao índice de outra, dizendo: “Senhor, dignais-Vos consagrar e santificar estas mãos com a unção e com a nossa benção, para que tudo quanto elas abençoarem seja abençoado, e tudo quanto consagrarem seja consagrado e santificado em nome de N.S.J.C.”.
Passa, em seguida, a entregar-lhe os instrumentos. Faz-lhe tocar o cálice que contém água e vinho, e a patena com a hóstia dizendo: “Recebe o poder de oferecer o sacrifício a Deus; e de celebrar a Missa pelos vivos e defuntos, em nome do Senhor”.
E passa imediatamente, acompanhando o Bispo, a celebrar a sua primeira santa Missa. Depois da comunhão, impõe-lhe o consagrante novamente a mão na cabeça, dizendo: “Recebe o Espírito Santo: a quem perdoardes os pecados, ser-lhe-ão perdoados; a quem os retiveres, ser-lhe-ão retidos.” Poder inaudito! E sente objetar-lhe, como outrora Jesus foi aparteado pelos escribas: “Mas quem pode perdoar os peados, senão Deus?” (Mac 2, 7). De pleno acordo! É preciso ser Deus para poder absolver um pecador; mas por isso mesmo é chamado na sagrada Escritura: “Vós sois deuses”.
É o próprio Deus que assim apelida aos Levitas da Antiga Lei, em vista do poder extraordinário de que foram revestidos.
Na verdade, é um Deus quanto ao poder de perdoar os pecados ou de os reter; porque está nele o poder de Jesus, o poder de Deus. – É um outro Cristo. – É o depositário do divino poder, mediador entre deus e os homens, imagem visível do Grande Pastor de Ovelhas.

*  *  *

Oh! Não fora a graça da fé, meu Deus, nunca acreditaria em tal! Não fora a graça do Vosso amor, nunca homem algum se abalançara a tanto! O sacerdote um outro Cristo?! Um Deus! Compreendo que vós, Jesus, mandeis ao homem que seja perfeito como vosso Pai no céu é perfeito; mandais que aprenda de vós a humildade e vos imite em tudo, porque sois o Deus feito homem e o neo-presbítero, um homem feito Deus: - Alter Christus!

3.  O Sacrifício.
É chegado o momento soleníssimo, em que o neo-sacerdote sobe ao altar para oferecer o sacrossanto sacrifício da cruz.
Que é um sacrifício? O sacrifício verdadeiro e propriamente dito, segundo no-lo define o próprio Espírito Santo pela boca de Moisés e São Paulo, é a oblação de coisa sensível com a sua destruição quer parcial, quer total, quer seja física (como se dá com o holocausto) quer mística, (como se dá com a libação e efusão de vinho ou água) efetuada por um ministro legítimo e feita só a Deus, com o fim de manifestar os sentimentos internos, com que o homem deve reconhecer o seu supremo domínio. Desde que há memória do homem decaído, não faltaram sacrifícios entre os povos.
Passando pelos mais, limito-me a apontar o de Melquisedec, narrado nas Escrituras, e que tem, por isso mesmo, o testemunho infalível do Espírito Santo, e que é muito próprio para o nosso caso.
Melquisedec ofereceu a Deus o sacrifício de pão e vinho, símbolo perfeitíssimo do sacrifício da Nova Aliança, em que o pão, pelo poder das palavras da consagração, se transubstancia em Corpo de Cristo, e o vinho em Sangue de Cristo. Recordo ainda o sacrifício da lei mosaica, que é considerado debaixo de quatro pontos de vista, devido aos quatro diversos fins: O sacrifício latrêutico, que visa direta e exclusivamente, segundo a intenção do sacrificante, o fim de reconhecer por ele o supremo e inalienável domínio de Deus sobre tudo o que existe. Por isso, neste sacrifício há destruição total da oferta ou vítima, há destruição física; e é por isso dito holocausto. – O sacrifício eucarístico, que visa diretamente o fim de render graças a Deus pelos favores e benefícios outorgados; e chama-se “hóstia pacífica”. – O impetratório, que visa a obtenção de novas graças e novos benefícios. – O propiciatório, que visa aplacar a Deus, e por isso é chamado também de satisfatório, cujo escopo é oferecer a Deus vítimas em expiação dos pecados, em satisfação das penas devidas pelos pecados, e chama-se “hóstia pro delicto” e “hóstia pro peccatis”.
Do dito se colhe que o sacrifício tem como fim reconhecer a perfeição infinita do ser Divino e do seu soberano domínio sobre quanto veio à existência por seu infinito poder. O reconhecimento do Ser perfeitíssimo, que é Deus, é uma Eucaristia ou agradecimento no pleno rigor da significação do termo; ela abrange em sua verdadeira acepção as idéias da adoração, em virtude da qual o homem se aniquila na presença da divina Majestade; da gratidão, que leva o homem a exaltar os benefícios de Deus; da imperfeição, que induz o homem a implorar as graças de que necessita; da expiação, que faz com que se obtenha a supressão da justa ira do Senhor, prestes a fulminar sobre o homem o seu tremendo castigo.
Estes são e devem ser os quatro fins que visa todo e qualquer sacrifício que se oferece à Divindade, os quais se podem reunir em um púnico, que é o de unir intimamente o homem a Deus; e chama-se a eucaristia-sacrifício.

4. O sacrifício da Nova Aliança.
Exposta a noção geral do sacrifício, qual é entendido por todas as religiões verdadeiras e falsas, releva acentuar mais a significação do sacrifício da Nova Lei, o sacrifício da religião revelada, sacrifício da religião cristã, o único aceitável a Deus, sendo o único prescrito por ele próprio. Abrogando Deus a religião mosaica, aboliu o sacrifício que nela fora ordenado; e fundando uma religião diversa da de Moisés, estabeleceu um sacrifício diferente do de Moisés.
Cristo, o Filho de Deus, veio ao mundo para fazer a vontade do Pai. Depois de haver aperfeiçoado a lei de Moisés e modificando a religião judaica, instituiu um sacrifício digno da lei e da religião divinamente acabadas: é o sacrifício de um homem-Deus.
A natureza humana, unida hipostaticamente à Pessoa divina, isto é, ao verbo, segunda Pessoa da santíssima Trindade, não pratica ação que não se deva atribuir à Pessoa; ora, em Jesus há uma única Pessoa, e esta é divina; Jesus é Deus, e o que Deus faz é ato de valor infinito e, se bem que o sacrifício seja de natureza humana, todavia o sacrifício de Jesus é ação que se deve atribuir à Pessoa divina, ao Verbo; mas a ação do Verbo é infinita, logo, infinito é o sacrifício; logo, o sacrifício do homem-Deus é de valor infinito. Portanto, de todos os sacrifícios é o sacrifício de cristo, o Homem-Deus, que de um modo mais perfeito preenche os quatro fins acima expostos; porque, considerada a dignidade da vítima imolada em holocausto, que vítima houve jamais ou haverá que supere em dignidade ou excelência a Vítima divina, Jesus Cristo? O sacrifício de Cristo, embora um único, valeu infinitamente mais do que os milhões e bilhões de vítimas puramente humanas ou irracionais de todos os tempos.
Esta é a verdade que a Igreja definiu nos Concílios Efesino e Tridentino, quando disse que Cristo se ofereceu a Deus Pai sobre o altar da cruz, para lá efetuar a nossa eterna redenção.
Sim, a morte de Cristo na cruz foi um verdadeiro sacrifício. Em Cristo temos o sacerdote constituído por Deus desde toda a eternidade e por isso legítimo. Em Cristo temos a vítima sensível, verdadeira e realmente imolada na cruz. Temos portanto, os dois requisitos essenciais para todo o sacrifício: o sacerdote e a vítima. (N.B. Não é requisito essencial que seja o sacerdote quem mate a vítima, mas sim quem a ofereça). Em Cristo temos outrossim perfeitamente verificados os quatro fins do sacrifício: Cristo por sua morte na cruz reconhece o supremo domínio de Deus, aplaca a divina majestade, expia as penas dos pecados, impetra novas bênçãos do alto e rende graças a Deus pelos benefícios recebidos.

5. O Santo Sacrifício da Missa.
Enquanto houver homens sobre a terra é mister que haja sacrifícios; e isto por força dos fins que visa toda sacrifício: o reconhecimento da soberania absoluta de Deus, o rendimento de graças ao Senhor pelos benefícios recebidos, a impetração de novos favores divinos e o aplacamento da ira divina, ofendida pelos pecados, e a satisfação das penas merecidas.
Ora, que outro sacrifício poderia ser mais grato a Deus e preencher de modo mais perfeito a finalidade do sacrifício do que o sacrifício do Homem-Deus?
Eis aqui por que, fundando Cristo sua religião sobre a terra, lhe deu um novo sacrifício, que é a continuação do sacrifício oferecido outrora, cruentamente, sobre o Calvário: o sacrifício da Missa!
O sacrifício da Missa é um verdadeiro sacrifício; porque é, primeiro, um ato público efetuado segundo um rito determinado e por ministros para isso especificamente deputados. Este rito e estes ministros foram instituídos por Deus mesmo, que aboliu o rito e os mistérios da Lei Antiga. Por isto, de todos os sacrifícios, é o da santa Missa o único aceitável a Deus, porquanto é ele a renovação e a aplicação daquele do Calvário, do qual tem a plena eficácia.
É, em segundo lugar, verdadeiro sacrifício, porque se oferece na Missa uma coisa sensível, que é o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo, debaixo das espécies de pão e vinho, o mesmo Corpo e o mesmo Sangue que um dia ficou imolado no alto do Calvário, oferecido pelo próprio Sumo Sacerdote, Jesus Cristo. Se há uma diferença entre os dois, esta consiste em que o Sacrifício do Calvário foi cruento; em que no Calvário Cristo se ofereceu pessoalmente sem ministros, enquanto nos nossos altares se oferece mediante o ministério dos sacerdotes; em que no Calvário o sacrifício nos mereceu a redenção, e nos nossos altares, a aplicação dos frutos dela.
Portanto, não há motivo algum para negar que o Sacrifício da Missa seja verdadeiro sacrifício: temos nela o sacerdote e temos a vítima.

6.       A Eucaristia – Sacramento.
A respeito do sacrifício seria incompleto se passássemos em silêncio um elemento, não digo essencial, mais integral de todo o sacrifício: A Eucaristia-Sacramento.
Parece provado que a todos os sacrifícios, assim pagãos como judaicos, estava anexa a ideia de que, para ser completo o sacrifício, era mister unir-se à divindade com a participação efetiva e real das vítimas: isto é, com a comunhão, como diríamos hoje, em que se come da vítima.
Fosse como fosse a ideia dos pagãos e judeus a respeito da comunhão, o certo é que o sacrifício da Missa, não só é Eucaristia-Sacrifício, senão também Eucaristia-sacramento. Sim, no sacrifício da Missa a criatura não só se dá inteiramente a Deus em holocausto, mas é por Deus convidada a assentar-se à sua mesa celeste, sobre a qual ele oferece a comer e a beber aquela mesma vítima, a carne e o sangue preciosíssimos de Jesus.
Ó alimento divinizado pela consagração! Alimento divino! O Corpo e o Sangue unidos à alma e à divindade de nosso Senhor Jesus Cristo! Alimento único; pois só ele tem a virtude de operar a fusão de Deus com o homem, união que proporciona à criatura bens inúmeros, que a transforma e a torna sempre mais semelhante ao seu Criador.
Que realidade consoladora! Pela Eucaristia-Sacramento ou pela comunhão que devo fazer, sempre que celebro, uno-me de modo admirável a Deus; nutro-me com a substância divina; sou de certa maneira divinizado; preparo-me insensivelmente para a páscoa da vida eterna.

*  *  *

Quer-me agora parecer que não é necessário insistir ainda no valor do santo sacrifício da Missa. É mais que evidente. Aqui temos um Deus que se imola, um Deus que é imolado. Que cúmulo de mistérios!
Entretanto, importa relembrar que o sacrifício da Missa é de valor infinito, para que ninguém se escuse de não ter encontrado o suficiente para si. É um mar inexaurível de graças e benefícios. Só quem bebe deste mar agrada a Deus; só quem assiste à Missa presta a Deus o sacrifício por ele aceito. Afora o sacrifício da Missa, nenhum outro pode ser agradável a Deus e proveitoso ao homem e tão proveitoso, que santos do céu participam da sua glória, as almas do purgatório e os vivos da terra gozam superabundantemente dos seus benefícios. É que o sacrifício da Missa constitui o único holocausto verdadeiramente digno do Senhor, em que se sacrifica o Cristo sempre vivo para interceder em nosso favor. Aqui, como sobre a cruz, o Cristo se constitui o vínculo vivo que nos une a deus.
No santo sacrifício da Missa temos o ato em volta do qual gravita e dele se irradia o próprio sacrifício da Redenção. Sim, na santa Missa, aquele mesmo sacrifício, oferecido um dia sobre o Calvário, assume a condição como de coisa que ocupa a circunferência, como de um satélite gravitando em volta do sol, como de uma fonte viva que deságua no oceano. A santa Missa é o entro, é o sol e é o oceano onde se concentra o próprio sacrifício do Calvário que é eterno, e ao mesmo tempo perpetuado no tempo, no céu perante Deus e na terra entre os homens; é o mistério da consumação de todos os desígnios de Deus, realizado um dia e renovado por todos os séculos até ao fim do mundo.

*  *  *

É tendo presente o exposto que o sacerdote deve oferecer o tremendo ato religioso. Oxalá se aproximasse sempre para o futuro da ara sagrada do Senhor com estas disposições de alma que o dominam ao presente!
Quem dera, pudesse comunicar e, comunicadas, conservar estas mesmas santas e invejáveis disposições nas almas de todos os assistentes ao santo e inefável sacrifício da Missa! Quisera, sim, que todos os cristãos se persuadissem de vez por todas ser o santo sacrifício da Missa o ato de religião mais necessário!



 Publicado Anteriormente:
Introdução.